O Valencia Club de Fútbol é um dos maiores e mais tradicionais times da Espanha. Dono de seis títulos da La Liga, oito Copas do Rei, uma Liga Europa e duas vezes finalista da Liga dos Campeões, o clube tem uma das histórias mais ricas do futebol espanhol. No entanto, nos últimos anos, a sua imagem vem sendo arranhada. E o principal responsável por isso tem nome e sobrenome: Peter Lim.
Peter Lim é um magnata de Singapura. Extremamente rico, seu patrimônio é avaliado em cerca de 2 bilhões de dólares, devido a vários investimentos feitos por ele ao longo de sua carreira. A sua ligação com o futebol é antiga. O singapurense já tentou adquirir o Liverpool em 2010 e seu nome esteve ligado ao Milan em 2013. Mas foi apenas em maio de 2014, quando adquiriu 70% das ações do Valencia, que Lim conseguiu comprar uma instituição futebolística.
Com o objetivo de transformar Os Morcegos em uma potência, a chegada de Peter Lim foi bem vista pela maioria dos torcedores, uma vez que ele era uma esperança de salvar o clube das dívidas e reerguer a equipe espanhola. Na primeira temporada, o saldo foi positivo. Com o português Nuno Espírito Santo no comando, o time fez uma boa campanha na La Liga e alcançou uma vaga na Liga dos Campeões da Europa. Mas parou por aí. Após isso, tivemos um festival de decisões equivocadas.
O magnata de Singapura interferia não só no aspecto financeiro, mas também nas decisões esportivas. Neste contexto, Peter Lim, nas temporadas 2015/16 e 2016/17, não foi capaz de desenvolver um projeto esportivo eficiente no clube. Para além de promover muitas trocas no comando técnico da equipe, o singapurense também contratou treinadores bem questionáveis neste período, como Gary Neville, Cesare Prandelli e Pako Ayestaran. Além disso, algumas aquisições de atletas também foram bem duvidosas do ponto de vista financeiro.
Sobre isso, há um tópico que merece ser destacado: conforme indicam certos rumores, parece que Peter Lim e Jorge Mendes, empresário português muito influente no mundo da bola, se compactuaram no momento da compra do Valencia por parte de Lim. A partir disso, o clube passou a contratar vários jogadores empresariados por Mendes, como Rodrigo Moreno, André Gomes, João Cancelo, Enzo Pérez, Álvaro Negredo e Aymen Abdennour. O problema não era esse, mas sim que tais atletas foram contratados por preços elevados.
Inclusive, como noticiou o site Record, de Portugal, Antonio Sesé, antigo conselheiro do Valencia, afirmou que Peter Lim e Jorge Mendes se organizaram, sob um acordo, para contratar jogadores de escasso valor patrimonial por valores altos. Além disso, aconteceram outras contratações alegadamente desaconselhadas devido à condição física dos jogadores. Segundo Sesé, os dois foram responsáveis por negociações corruptas.
Deixando as polêmicas e os rumores de lado, o fato é que Lim, após errar tanto na escolha do técnico, finalmente acertou um nome na temporada 2017/18. Chegava ao Valencia Marcelino García Toral, um dos treinadores mais respeitados da Espanha. Promovendo um futebol altamente competitivo e bem organizado, principalmente na fase defensiva, Marcelino não só foi capaz de fazer Os Morcegos voltarem a terem resultados expressivos, como também trouxe uma estabilidade ao clube, após anos bem turbulentos. A equipe, aliás, conquistou o título da Copa do Rei 2018/19, vencendo o Barcelona na grande decisão.
Time competitivo e organizado. Técnico realizando um trabalho estável e interessante. Resultados conquistados. Desempenho em campo. Vários atletas potencializados e rendendo muito. Clube vivendo uma situação mais tranquila. É aí que você pensa: “Peter Lim vai deixar tudo como está e não vai mais interferir nas decisões esportivas, certo? ”. Errado. Não podemos nos esquecer que ele é altamente autoritário e quer se impor a todo momento. E, no início da temporada 2019/20, Marcelino foi demitido após questionar e contrariar muitas decisões do mandatário do clube, mesmo o técnico espanhol tendo total apoio de todo o elenco e dos torcedores. E era assim que Lim jogava fora o melhor trabalho dos últimos anos.
A partir disso, a relação entre o dono da instituição e dos adeptos do Valencia, que já era desgastada, passou a ser inviável. Como não bastasse isso, uma grave crise interna e financeira voltou a atingir lá pelos lados de Mestalla. Necessitando levantar fundos financeiros e querendo mostrar todo o seu poder, Peter Lim optou por fazer uma reformulação no elenco na janela de transferências da temporada 2020/21. Mas tal reestruturação promovida pelo mandatário foi feita sem critérios e apenas pautada no seu desejo de impor autoridade. O resultado disso foi que o time ficou enfraquecido, porque este mercado foi um completo desastre para o clube.
Francis Coquelin foi vendido ao Villarreal, um dos maiores rivais do Valencia, por 6.5 milhões de euros, segundo o site Transfermakt. Valor abaixo para os padrões europeus. Rodrigo Moreno, um dos jogadores mais técnicos do time, rumou para o Leeds United. Ferrán Torres, um jovem atacante talentoso e promissor, foi para o Manchester City. Neste caso específico, a ida dele ao clube de Pep Guardiola parecia irreversível, visto que o seu contrato estava próximo do fim.
Mas o caso mais simbólico que representa o autoritarismo de Peter Lim foi o de Dani Parejo. Ídolo, capitão, referência técnica da equipe e um dos meio-campistas com melhor rendimento no futebol espanhol foi para o Submarino Amarelo de graça. É exatamente isso que você leu, o craque e o líder do time foi embora de graça. E sabe por que? Porque Parejo foi um dos atletas que bateu de frente com Peter Lim. Por isso, ele resolveu dispensá-lo do clube. Um episódio, assim como toda essa história envolvendo o mandatário e o Valencia, completamente revoltante.
Atualmente, sob o comando de Javi Gracia, Os Morcegos não começaram muito bem a La Liga, como era o esperado. Em sete jogos na competição até o momento, o time soma duas vitórias, um empate e quatro derrotas. E a tendência para a atual temporada é que o clube não atinja níveis de protagonismo na Espanha.
Um exemplo de péssima gestão e de como ser autoritário, arrogante e irresponsável. Peter Lim consegue arranhar a imagem de um dos clubes mais tradicionais e vitoriosos do futebol espanhol. Uma falta de respeito com os amantes da bola e, principalmente, com os seus apaixonados torcedores, que são os maiores patrimônios do Valencia Club de Fútbol.
Para finalizar, a grande mensagem desse caso que engloba Peter Lim, Valencia e administração de futebol é que o sucesso esportivo e financeiro de uma instituição vai muito de além de um alto poderio financeiro. Acima de tudo, é necessário saber como gerenciar as finanças de forma equilibrada e, sobretudo, uma gestão profissional, responsável e comprometida em manter o clube estável e saudável.
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