Durante os 21 anos de ditadura militar, a população brasileira sofreu com censura à imprensa, repressão política e perseguição e tortura impostas a qualquer um que se posicionasse contra o regime. Entre as inúmeras áreas do país afetadas, o futebol também foi vítima, com o uso político do sucesso da seleção pelo presidente Médici e a demissão de João Saldanha, boicotado por suas críticas públicas aos militares, que queriam escolher alguns atletas convocados para a Copa do Mundo de 1970. No meio disso, o Botafogo foi um dos clubes que mais sofreram durante aqueles anos, com uma série de acontecimentos que culminaram na perda da sede de General Severiano.
Manifestação de 1968
Em um dos períodos mais duros da ditadura, uma série de manifestações ocorreu naquele ano, por conta da morte de um estudante pelas mãos de um policial. Em junho, cerca de 2 mil estudantes realizaram um protesto na UFRJ, em Botafogo, em busca de melhores condições de estudo e o fim das prisões arbitrárias. Pouco depois, os militares chegaram com bombas e força bruta para dispersar a manifestação, apesar do reitor Clementino Fraga solicitar o fim do cerco.
Do total de presentes, cerca de 200 estudantes encontraram abrigo em General Severiano, sede do Botafogo, com a permissão do presidente Altemar Dutra. Mesmo com a proibição da entrada dos militares por parte dos dirigentes, não demorou para uma invasão ocorrer.
Vários funcionários, incluindo o presidente, ficaram feridos diante da ação da polícia. Além disso, clientes e até crianças estavam presentes e também sofreram com a situação. Os estudantes envolvidos foram torturados e presos.
A gestão de Charles Borer
Em uma eleição polêmica, Charles Borer, um policial ligado ao sistema nacional de inteligência da ditadura, se tornou presidente do Botafogo na década de 70. Com uma gestão controversa, o dirigente afundou o Botafogo em dívidas, no início do maior jejum de títulos da história do clube.
Além do péssimo trabalho, o ex-mandatário colecionou falas polêmicas na época, sobretudo em relação a torcida: “Pouco me importa a torcida. Torcedor é volúvel, só aparece na vitória. Se o time perde, ele some. […] Torcida não é património, não faz o clube. Posso sair sem título, mas deixo um clube. Se não consigo ser o primeiro, tanto faz ser vice como último.”
Em um dos piores momentos da história do Glorioso, Borer acertou a venda da sede de General Severiano para a Vale do Rio Doce, uma forte estatal militar, por um valor bem abaixo do mercado. Com a perda de seu maior patrimônio, o clube carioca colecionou vexames e só voltaria a levantar uma taça em 1989.
Atualidade e legado
O Botafogo recuperou General Severiano no início de década de 90, e o terreno permanece, até hoje, como sede oficial do clube, sendo muito visitada em tours e recebendo vários eventos, muitos relacionados ao Glorioso.
Com sucessivas gestões ruins pós-Borer, o Botafogo não teve anos fáceis recentemente, chegando a atingir R$ 1 bilhão em dívidas. No entanto, a postura do clube e de figuras históricas, como João Saldanha e Afonsinho, em um dos períodos mais duros da história do Brasil, mostram como a grandeza do Glorioso não pode ser questionada, mesmo nos piores momentos. Com a chegada da SAF, a torcida retomou a confiança no retorno aos dias de glória, sem deixar de valorizar o passado.