Passada a euforia da final, precisamos falar da trajetória do São Paulo até o título inédito da Copa do Brasil. Nem os melhores roteiristas do cinema pensariam em uma trama tão perfeita para coroar o Tricolor Paulista com essa conquista. Se existisse uma “jornada do herói” no futebol, a melhor forma de descrevê-la seria apontando a caminhada da equipe de Dorival Júnior (e de Rogério Ceni no início da competição) até a tão sonhada glória.
Depois de tanto tempo batendo na trave, sendo eliminado de formas dolorosas, vendo diversos times conquistá-la, a Copa do Brasil finalmente entrou na galeria de títulos do São Paulo. Agora, sem mais delongas, vamos ver o que tornou esse triunfo tão especial, a famosa “jornada até a Copa do Brasil”.
São Paulo precisava desse título para fechar sua coleção
O São Paulo se tornou uma equipe extremamente relevante no cenário nacional e internacional por conta da sua fome por títulos. Mesmo com apenas 93 anos, o Tricolor Paulista conseguiu empilhar 22 Paulistas, seis Brasileiros, três Libertadores, três Mundiais, duas Recopas, uma Sul-Americana e diversos outros troféus. No entanto, tinha uma peça faltando nessa coleção de conquistas para completar o quebra-cabeça: a Copa do Brasil.
Em seu período vencedor, o São Paulo priorizava outras competições, até porque, anteriormente, quem disputava a Libertadores não poderia jogar a Copa do Brasil. Com o tempo, este título foi ganhando mais relevância e assistir seus rivais, clubes grandes e de menor expressão levantando a taça era doloroso. A vez em que o Tricolor Paulista se viu mais perto dessa conquista foi em 2000, quando chegou na final e teve seu sonho arruinado pelo Cruzeiro.
Com o passar do tempo, a Copa do Brasil foi se tornando uma obsessão para o São Paulo, entretanto, parecia algo muito distante de se conquistar. Para aquele personagem que quer ser protagonista, desistir nunca é uma opção e o Tricolor Paulista superou todos os vexames que viveu anteriormente nesta competição para conseguir a peça que faltava. Em 2023, aquele quebra-cabeça que passou muito tempo incompleto foi finalizado. A galeria de títulos do São Paulo foi completa com a Copa do Brasil.
São Paulo estava passando pelo pior momento de sua história
Para quem se acostumou com o São Paulo empilhando diversas conquistas, o período de 2009 até 2023 foi um verdadeiro pesadelo. Na “jornada do herói”, existe o momento que o personagem passa por um momento turbulento e precisa se reinventar para atingir seus objetivos. Assim como Os Vingadores tiveram uma derrota sofrível para o Thanos, o Luke Skywalker foi humilhado por Darth Vader e Harry Potter teve que encarar a culpa pela morte de Sirius Black, o São Paulo passou por um período desolante e que parecia impossível de se reerguer.
O Último mandato de Juvenal Juvêncio, os anos com Aidar e o período de Leco como presidente do São Paulo fizeram o clube entrar em um buraco profundo. Desde 2009 até 2022 o Tricolor levantou apenas duas taças: a Sul-Americana em 2012 e o Paulistão em 2021. Mas não foram por essas conquistas que esse período ficou marcado, foram pelos vexames, goleadas sofridas, eliminações precoces, contratações que não deram certo e, o pior de tudo, chegar bem perto de levantar taças e perdê-las de maneiras inexplicáveis.
Assim como o herói precisa de um feito inimaginável para se reerguer, o São Paulo teve que sonhar alto para deixar este período turbulento no passado. O mandato de Júlio Casares não é isento de críticas, entretanto, ele conseguiu recuperar duas coisas que pareciam perdidas: o orgulho da torcida e a competitividade do clube. Depois de tanto vivendo um pesadelo, o São Paulo conseguiu o feito heroico de conquistar a Copa do Brasil para ressurgir no cenário do futebol brasileiro.
O início da jornada do São Paulo na Copa do Brasil
O São Paulo começou a sua caminhada na Copa do Brasil tendo que superar o Ituano, adversário difícil considerando a fase da competição. Além disso, a equipe de Rogério Ceni passava pelo momento mais turbulento desde seu retorno ao clube, deixando a missão ainda mais complicada. Eliminação pelo Água Santa nas quartas de finais do Paulistão, atritos entre o treinador e jogadores do elenco e desempenho em campo que preocupava a torcida. O momento do Tricolor Paulista refletiu diretamente no resultado do primeiro duelo contra o Ituano: empate por 0 a 0 no Morumbi.
Para a partida de volta, a diretoria do São Paulo se viu na necessidade de demitir Rogério Ceni e buscar outro treinador para mudar o ambiente. E, pouco tempo após essa decisão, a engrenagem para fazer a máquina funcionar foi encontrada.
Dorival Júnior, o atual campeão da Copa do Brasil e da Libertadores, foi anunciado uma semana antes do confronto contra o Ituano. A missão do treinador não era fácil, mudar os ânimos do clube em apenas seis dias para se manter vivo na competição nacional. No entanto, o roteiro para o sucesso começou a ser escrito e, com um gol de Wellington Rato, o São Paulo eliminou o Ituano na Copa do Brasil por 1 a 0 jogando como visitante.
Ainda que o desempenho estivesse longe do esperado, Dorival Júnior conseguiu fazer o Tricolor Paulista atingir bons resultados e mudar o ambiente inseguro do clube. A próxima parada na Copa do Brasil seria contra o Sport Recife, outro adversário complicado.
O descuido do São Paulo que quase resultou na eliminação
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A primeira partida entre São Paulo e Sport Recife seria em Pernambuco, na Ilha do Retiro. Dorival Júnior, mesmo invicto, ainda estava acertando sua equipe e sabia que não seria nada fácil passar dessa fase na Copa do Brasil. De maneira surpreendente, o Tricolor Paulista conseguiu vencer o Leão por 2 a 0, gols de Luciano e Marcos Paulo, jogando como visitante e sendo superior na partida.
Todos sabemos que na “jornada do herói” nada é linear, sendo algo que se repetiu na “jornada até a Copa do Brasil”. Existem diversos desafios e imprevistos que aparecem na trajetória do herói e, como o Tricolor Paulista é o protagonista dessa narrativa até a conquista, o roteiro preparou surpresas.
No jogo de volta, com a sua torcida no Morumbi, o São Paulo precisava fazer o simples para garantir a classificação para as quartas de final da Copa do Brasil. No entanto, o Sport surpreendeu e conseguiu arrancar o 3 a 1 no tempo regulamentar. Disputa de pênaltis. O Tricolor Paulista foi eliminado na última vez em que se viu nessa ocasião e o desespero tomava conta do torcedor.
Assim como os heróis buscam forças de onde não tem para conseguir seus objetivos, os jogadores do São Paulo precisavam vencer esse “inimigo” do passado. E venceram. O inimigo da vez era desapontar a torcida com outra eliminação nos pênaltis e, em um ato heroico, Rafael voou para defender o pênalti de Luciano Juba e espantou o fantasma da eliminação precoce. Pablo Maia fez o gol decisivo e o São Paulo se classificou para as quartas de final da Copa do Brasil.
Os desafios aumentaram: São Paulo reencontrou o Palmeiras na Copa do Brasil
Agora começamos a entrar no clímax da trama e os desafios do São Paulo na Copa do Brasil só aumentaram. Depois de quase ver seu sonho se despedaçar nas oitavas de final, os jogadores e o treinador do Tricolor Paulista entenderam que eles não podiam subestimar nenhum adversário, todo esforço precisava ser dobrado.
O adversário da vez na competição seria o Palmeiras, rival que empilhou diversas conquistas nos últimos anos e se tornou protagonista em diversas competições, ao contrário do São Paulo. Este mesmo confronto aconteceu na Copa do Brasil no ano passado, em que o Clube da Fé conseguiu eliminar de maneira surpreendente o Alviverde na disputa de pênaltis.
De um lado, temos a vontade de repetir o feito épico de 2022, do outro a necessidade de conseguir a vingança da ocasião passada. O confronto entre São Paulo e Palmeiras prometia ser um verdadeiro campo de batalha. No entanto, era evidente que a equipe de Dorival Júnior se transformou com as experiências passadas e adotou uma nova postura para enfrentar o time de Abel Ferreira.
Na primeira batalha, o São Paulo mostrou superioridade dentro do Morumbi e superou o Palmeiras com um golaço de Rafinha no apagar das luzes. O próximo confronto seria mais complicado, dentro do Allianz Parque, lugar em que o Clube da Fé passou por vexames dolorosos. Entretanto, não era hora dos jogadores do Tricolor Paulista lembrarem do passado, o foco era no presente, em que eles tinham que derrubar este gigante para chegar na semifinal.
A mentalidade do São Paulo para o jogo de volta era impressionante. Mesmo saindo atrás no placar, com gol de Piquerez no primeiro tempo, a equipe de Dorival não abaixou a cabeça. Em um segundo tempo impecável, Caio Paulista e David balançaram as redes para o Clube da Fé no Allianz Parque. Vitória por 2 a 1 no placar. O cenário era de silêncio nas arquibancadas e comemoração dos visitantes dentro do campo.
Mais um passo importante foi dado pelo protagonista da nossa história, desbancar um gigante com predominância nas duas partidas, o São Paulo se via cada vez mais próximo da tão sonhada Copa do Brasil.
Mais um gigante no caminho: São Paulo encontrou Corinthians na semifinal
Um fato que sempre ficou evidente na “jornada do herói” é que os protagonistas não têm tempo para relaxar e o São Paulo não teve tranquilidade na “jornada até a Copa do Brasil”. Logo depois de desbancar o brilhante Palmeiras de Abel Ferreira, o Tricolor Paulista ia enfrentar outro rival na próxima fase: o Corinthians de Luxemburgo.
Apesar de não ser um adversário vivendo uma ótima fase, o Timão sempre foi um carrasco do São Paulo em mata-matas, diferente do Palmeiras. A luta contra o Corinthians não seria apenas dentro do campo, os jogadores do Clube da Fé precisavam não ceder à pressão dos resultados anteriores contra este mesmo rival.
A primeira partida aconteceu na Neo Química Arena, local em que o São Paulo nunca tinha vencido. E, nessa ocasião, as situações do passado falaram mais alto. O receio de uma batalha que se repetiu várias vezes, e nunca com um final feliz para o Tricolor Paulista, tomou conta dos jogadores. O Corinthians superou a equipe de Dorival Júnior por 2 a 1 no jogo de ida, gols de Renato Augusto para os mandantes e de Luciano para os visitantes.
Não era hora de jogar a toalha, afinal, o confronto de volta era no Morumbi, com o apoio dos são-paulinos. Era uma batalha complicada e a diretoria do Clube da Fé agiu rapidamente em busca de reforços. Em pouco tempo, dois nomes de peso chegaram para ajudar o clube: James Rodríguez e Lucas Moura.
Eles não tiveram muito tempo para se adaptar, entretanto, Lucas já conhecia o São Paulo e se sentiu em casa rapidamente. Chegou a hora. Morumbi com 60 mil torcedores, festa maravilhosa, reforços importantes e apenas um objetivo: ir novamente para a final da Copa do Brasil.
Aquilo que parecia distante, se tornou realidade. Com um golaço de Wellington Rato e outro de Lucas Moura, que fez uma partida brilhante, o São Paulo derrubou o Corinthians na semifinal. A comemoração foi grande, mas a jornada ainda não tinha chegado ao fim.
A grande final: primeiro jogo entre São Paulo e Flamengo
Era o momento do São Paulo acabar com a dolorosa noite de 2000 na Copa do Brasil. Busca pelo título inédito e de maneira épica: desacreditado, quase tropeçando nas oitavas e derrubando dois rivais na competição. O treinador Dorival Júnior também tinha motivos para sonhar com essa conquista, afinal, a partida seria contra seu ex-clube. O Flamengo, de maneira inexplicável, optou por não seguir com ele na temporada passada, mesmo após a conquista da Libertadores e Copa do Brasil.
Seria apenas a busca por um título inédito? Não. Era momento de buscar a vingança com uma diretoria que não confiou no trabalho de Dorival? Também não. Estava na hora de colocar o São Paulo novamente como um dos protagonistas no futebol brasileiro. Nas histórias fictícias, o herói só perde esse título quando cai no esquecimento. Na “jornada até a Copa do Brasil”, o Tricolor Paulista buscava relembrar sua relevância e impedir que suas glórias fossem esquecidas.
O primeiro confronto era no Maracanã e, mesmo com o Flamengo em um momento conturbado, o São Paulo não podia se descuidar. Até porque, assim como o Palmeiras, o Rubro-Negro empilhou diversas conquistas nos últimos anos. 17 de setembro era a data da primeira batalha e apenas um resultado importava. A mentalidade da equipe de Dorival Júnior foi o principal fator que levou o Clube da Fé até a final e, mais uma vez, foi essencial.
Os jogadores do São Paulo não sentiram a pressão do pior momento da história do clube no Maracanã e, sem sofrer tanto perigo, conseguiram superar o Flamengo por 1 a 0, gol de Calleri. A glória estava cada vez mais próxima, entretanto, nada estava decidido. Era necessário ter humildade e pés no chão.
O São Paulo finalmente conquistou a Copa do Brasil
24 de setembro. 16:00. A preparação do São Paulo para a grande final da Copa do Brasil começou muito antes disso. Desde quando a torcida entendeu seu papel como combustível para os jogadores. Desde o momento que Leco deixou a presidência do clube e o ambiente foi se transformando aos poucos. Desde que esse elenco cascudo foi montado. Pela primeira vez o Tricolor Paulista sentia algo essencial para a disputa: confiança.
Assim como toda a trajetória do nosso “herói” na Copa do Brasil, essa batalha foi complicadíssima. A torcida, apesar de confiante, estava nervosa e o elenco do São Paulo parecia se encontrar na mesma situação. No final do primeiro tempo, Bruno Henrique conseguiu se adiantar da defesa adversária e marcou o gol para o Flamengo que deixaria tudo igual.
“O passado não pode se repetir”, tenho certeza que era isso que passava na cabeça dos jogadores que viveram muitas situações turbulentas no clube. Eles carregavam a vontade de milhões de torcedores de ver o Clube da Fé campeão novamente, uma responsabilidade muito grande, digna de um verdadeiro herói.
Cinco minutos após esse baque, algo impressionante aconteceu. Falta cobrada por Wellington Rato, Rossi espalma para fora da área. No último lance do primeiro tempo, Rodrigo Nestor, alvo de diversas críticas dos torcedores, acertou um chute praticamente impossível e, atravessando 20 jogadores que estavam na área, a bola foi para o fundo do gol. 1 a 1, resultado era favorável para o São Paulo e vibração dos jogadores e torcedores foi enorme.
No segundo tempo o pensamento era um só para o Tricolor Paulista: “não podemos levar gol”. O tempo foi passando e o nervosismo aumentando. Cada minuto passado era como horas para o torcedor. Mas, dessa vez, o roteiro não foi cruel com o Clube da Fé. Depois de segurar a bola por nove minutos de acréscimos, o juiz sinalizou o final da partida. Sim, pode comemorar torcedor, o São Paulo foi campeão da Copa do Brasil pela primeira vez em sua história.
Uma comemoração magnífica começava a acontecer. Jogadores correndo, chorando e vibrando sem parar. Torcedores do Clube da Fé finalmente voltaram a gritar “é campeão” no estádio do Morumbi. Era uma noite inesquecível para todos que estavam no local e para aqueles que torcem para o Tricolor Paulista. E, o principal, o São Paulo finalizou a sua “jornada do herói”, o esquecimento foi evitado e a Copa do Brasil chegou. Depois de muito tempo, a peça que faltava se encaixou e o quebra-cabeça foi completo.